Carta de Jorge de Sena, datada de 25 de Maio
de 1969, para Eugénio de Andrade:
Em matérias de
glórias, eu sou, francamente, um sujeito contraditório: ao mesmo tempo as
pessoas incomodam-me (e muitas vezes até quando escrevem admirativamente a meu
respeito, sem que nisto vá ingratidão), o êxito parece-me risível, e sei melhor que ninguém a que várias
circunstâncias pode dever-se. Mas a hostilidade com que lutei desde a primeira
hora, ou que suscitei sem querer (ou muitas vezes por querer), deu-me também
uma sede de triunfo, de mundo a meus pés – talvez pelo que de outcast tenho sido sempre de grupos
literários ou profissionais. E isso o não sinto menos na minha vida
universitária, onde, no fundo, os meus «colegas» de cá e de lá não me perdoam
que eu tenha entrado na profissão «por cima», por força de uma bagagem maior
que a deles todos juntos. Mas tudo me fere: fui sempre a vida inteira o mesmo
menino esquecido e jogado entre os pais, sedento de atenção e de amor, dividido
entre estar só e acompanhado.
Sem comentários:
Enviar um comentário