O Poeta beija tudo, graças a Deus… E aprende com as coisas a sua lição
de sinceridade… E diz assim: «É preciso saber olhar…» E pode ser, em qualquer
idade, ingénuo como as crianças, entusiasta como os adolescentes e profundo
como os homens feitos… E levanta uma pedra escura e áspera para mostrar uma
flor que está por detrás… E perde tempo (ganha tempo…) a namorar uma ovelha… E
comove-se com coisas de nada: um pássaro que canta, uma mulher bonita que
passou, uma menina que lhe sorriu, um pai que olhou desvanecido para o filho
pequenino, um bocadinho de Sol depois de um dia chuvoso… E acha que tudo é
importante… E pega no braço dos homens que estavam tristes e vai passear com
eles para o jardim… E escreveu uns versos que começam desta maneira: «O segredo
é Amar…».
(…)
A gente tem vergonha de beijar tudo, de amar as flores, de se
enternecer com os animais, de dar um passeio. Se beija uma árvore, é parvo; se
traz uma flor na mão, é maricas; se se enternece, é fraco; se acaricia uma
menina, põe nessa carícia o sexo; se vai a qualquer parte para passear e ver o
mundo, faz constar que foi em viagem de estudo ou em viagem de negócios. Temos
vergonha de ser sinceros, de que nos creiam parvos, ou maricas, ou fracos, ou
lúbrico, ou estroinas. E então perdemos o melhor da nossa vida a ludibriar os
outros e a insultar as nossas intenções mais belas e generosas.
Sebastião da Gama em Diário
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