Tinha assumido que quando os críticos rejeitassem o meu trabalho, o
mesmo iria acontecer comigo, que o público me iria esquecer. Onde é que eu
estava com a cabeça? Por fim, tive de enfrentar a música - voltar às actuações –
a tão esperada reunião para a publicidade sensacionalista, excursões de ciganos
– a mudar de ideologias como se elas fossem pneus, sapatos, cordas de guitarra.
Qual é a diferença? Desde que as minhas certezas permanecessem intactas, não
devia nada a ninguém. Não ia afundar-me mais nas trevas por ninguém. Nas trevas
já eu estava. A minha família era a minha luz e eu ia proteger essa luz a
qualquer preço. Era aí que estava a minha dedicação, em primeiro, em último, e
em todos os lugares intermédios. O que eu devia ao resto do mundo? Nada.
Absolutamente nada… A imprensa? Achei que se deve mentir-lhes. Para o público, comecei
a ser o mais bucólico e mundano que consegui. Na vida real comecei a fazer as
coisas de que mais gostava e era tudo o que me importava – os Jogos da Pequena
Liga, festas de aniversário, levar os miúdos à escola, fazer acampamentos,
andar de barco, descer rios, canoagem, pesca,,, vivia dos direitos de autor dos
discos. Tornei-me imperceptível, quer dizer, a minha imagem é que se tornou.
Algures no passado tinha escrito e cantado canções que eram muito originais e
marcantes, não sabia se alguma vez voltaria a fazê-lo e não me importava nada
com isso.
Bob Dylan em Crónicas
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