quarta-feira, 13 de setembro de 2023

NATÁLIA: 100 ANOS

Sabe-se que não somos adeptos do registo de efemérides de nascimentos e mortes de personalidades. Mas têm acontecido.

Hoje, por exemplo, com a publicação do poema A Defesa do Poeta, marcamos o nascimento, há 100 anos, de Natália Correia.

O poema foi escrito enquanto decorria o processo de julgamento de Natália Correia, e outros autores, pela publicação, em tempos salazarentos, da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica. Natália queria que o poema fosse lido numa das sessões do julgamento mas o seu advogado, Manuel João da Palma Carlos, aconselhou-a a que não o fizesse.

Recordemos o que então se passou: 

Diário de Lisboa de 2 de Junho de 1969, noticiava que, nessa mesma tarde, começava, no Plenário Criminal da Boa Hora, o julgamento dos escritores envolvidos na publicação da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica: Natália Correia, Mário Cesariny de Vasconcelos, Luiz Pacheco e José Carlos Ary dos Santos eram acusados de «abuso de liberdade de imprensa.».

Também figuravam como presumíveis delinquentes, o editor Fernando Ribeiro de Melo, o empregado de escritório Francisco Marques Esteves e o técnico têxtil Ernesto Geraldes de Melo e Castro.

Segundo a acusação «algumas das poesias ou parte delas ofendem o pudor geral, a decência, a moralidade pública e os bons costumes.»

Como patronos dos acusados encontravam-se João da Palma Carlos, Vera Jardim, Salgado Zenha e António de Sousa.

Eram inúmeras as testemunhas de defesa.



O julgamento só aconteceria em Março de 1970.

Segundo o Diário de Lisboa, de 21 de Março, os réus, excepto Francisco Marques Esteves que foi absolvido, foram condenados a 45 dias de prisão substituíveis por multa a 40 escudos diários.

«Dado a sua precária situação económica o tribunal dispensou Luiz Pacheco do pagamento da multa diária.»

No final do julgamento, o juiz Fernando António Morgado Filipe, mandou que fossem destruídos todos os exemplares da Antologia da Poesia Erótica e Satírica.

A poesia ofendia o pudor, a decência, a moralidade pública e os bons costumes.

Mas quem assim pensava não se coibia de perseguir, torturar e assassinar cidadãos que lutavam pela Liberdade ou enviar para a guerra colonial a juventude de toda uma geração.

Um Portugal governado por um velho atroz, cercado por serviçais – que não eram assim tão poucos! - verdadeiramente desumanos, incultos e crentes abnegados numa senhora que um dia. por Fátima. «apareceu» a três pastorinhos.

Sem comentários: