Sabe-se que não somos adeptos do registo
de efemérides de nascimentos e mortes de personalidades. Mas têm acontecido.
Hoje, por exemplo, com a publicação do
poema A Defesa do Poeta, marcamos o
nascimento, há 100 anos, de Natália Correia.
O poema foi escrito enquanto decorria o
processo de julgamento de Natália Correia, e outros autores, pela publicação,
em tempos salazarentos, da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica.
Natália queria que o poema fosse lido numa das sessões do julgamento mas
o seu advogado, Manuel João da Palma Carlos, aconselhou-a a que não o fizesse.
Recordemos o que então se passou:
O Diário de Lisboa de 2
de Junho de 1969, noticiava que, nessa mesma tarde, começava, no Plenário
Criminal da Boa Hora, o julgamento dos escritores envolvidos na publicação
da Antologia
de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica: Natália Correia, Mário
Cesariny de Vasconcelos, Luiz Pacheco e José Carlos Ary dos Santos eram
acusados de «abuso de liberdade de imprensa.».
Também figuravam como presumíveis
delinquentes, o editor Fernando Ribeiro de Melo, o empregado de escritório
Francisco Marques Esteves e o técnico têxtil Ernesto Geraldes de Melo e Castro.
Segundo a acusação «algumas das
poesias ou parte delas ofendem o pudor geral, a decência, a moralidade pública
e os bons costumes.»
Como patronos dos acusados
encontravam-se João da Palma Carlos, Vera Jardim, Salgado Zenha e António de
Sousa.
Eram inúmeras as testemunhas de defesa.
O julgamento só aconteceria em Março de
1970.
Segundo o Diário de Lisboa, de
21 de Março, os réus, excepto Francisco Marques Esteves que foi absolvido,
foram condenados a 45 dias de prisão substituíveis por multa a 40 escudos
diários.
«Dado a sua precária situação económica
o tribunal dispensou Luiz Pacheco do pagamento da multa diária.»
No final do julgamento, o juiz Fernando
António Morgado Filipe, mandou que fossem destruídos todos os exemplares
da Antologia
da Poesia Erótica e Satírica.
A poesia ofendia o pudor, a
decência, a moralidade pública e os bons costumes.
Mas quem assim pensava não se coibia de
perseguir, torturar e assassinar cidadãos que lutavam pela Liberdade ou enviar
para a guerra colonial a juventude de toda uma geração.
Um Portugal governado por um velho atroz, cercado por serviçais – que não eram assim tão poucos! - verdadeiramente desumanos, incultos e crentes abnegados numa senhora que um dia. por Fátima. «apareceu» a três pastorinhos.
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