domingo, 3 de maio de 2020

DIÁRIO DOS DIAS DIFÍCEIS


Estes apontamentos diários ficam por aqui.

Não que ele entenda que os dias não vão continuar a serem difíceis, mas acontece que se perdeu no que inicialmente pensara fazer.

Acabou por cair em extremismos opinativos, acabou em lamechices parvas, as palavras nunca lhe saíram como ele queria que saíssem.

Pôs as culpas na historieta que os dias do vírus o perturbavam.

Balelas.

Sente que para continuar a viver os dias de pesadelo, teremos que viver de forma mais inteligente.

Mas os tempos são medíocres, repletos de chicos-espertos-opinativos, repletos de aldrabões e oportunistas.

Tem saudades da vida, mesmo sabendo que essa vida não tinha excepcionalidades por aí além, mas era a sua vida, a possível.

Sobram-lhe muitas dúvidas que isso venha a acontecer.

Quando os gestos diários estão sujeitos a estados de emergência ou de calamidade, sabe que nada disso lhe provoca serenidade, tentará o seu melhor esforço para irradiar um ligeiro optimismo, mas…

Das imagens que as televisões lhe deram dos encontros que a CGTP fez no 1º de Maio, ficou-lhe uma: um homem já de meia-idade, máscara no rosto, bandeira vermelha na mão, tem um minuto em que baixa a máscara, põe a bandeira vermelha debaixo do braço, e mete um cigarro à boca. O repórter mudou para outros personagens, mas ele sorriu e ficou a pensar no prazer do fumar que aquele homem de meia-idade passou a usufruir naquele manso cair da tarde.

Fumar mata.

E daí?

Morre-se de tanta coisa.

Até de amor, como o King Kong, seguindo ele os passos do Eduardo Guerra Carneiro.

«A sua chamada encontra-se em lista de espera».

Mas o tempo é agora de música.

Hoje foi o Dia da Mãe.

É pouco dado a efemérides, principalmente as deste tipo.

A Aida nunca aceitou que a Igreja lhe tivesse, a 8 de Dezembro, tirado o Dia da Mãe.

Lembrou-se de uma canção do Charles Aznavour: «La maman».

Uma canção que o pai, em determinados momentos de convívio petisqueiro, trazia à mesa na sua voz completamente desafinada e desarticulada.

Havia grandes sorrisos.

Mas ele não traz a versão do Aznavour, mas sim a do Domenico Modugno. Era desta que o pai gostava, sabe-se lá bem porquê, mas deve ter a ver com outra canção do Modugno de que ele gostava: o Volare, no azul pintado de azul, num mundo que pouco a pouco desaparecia.




1.

 «O poeta nunca entra em casa pela porta. E nem sempre usa a janela. Por uma questão de princípio, o poeta entra em casa por um buraco no telhado ou deitando abaixo uma parede. E esta é – e não outra – a razão pela qual muitos poetas dormem na rua. Ou racham a cabeça vezes sem conta.»

Rui Manuel Amaral

2.

Jair Bolsonaro, que se sente Messias só de nome, diz que o isolamento social contra a pandemia foi inútil e geraram desemprego.

Mas o homem continua a pensar que é apenas um resfriadozinho e no entanto a pandemia já matou mais de 6.000 brasileiros e há milhares e milhares de infectados.

O homem é um canalha e resta aos brasileiros que o homem venha a ser expulso do Palácio onde presuidencia.

E quanto mais depressa melhor.

3.

Temos muitas leis. Não sei se são todas boas, todas necessárias.

Mas por muito boas que essas leis sejam, o estado não tem mecanismos para as fazer cumprir.

E aqui é que reside o busílis da questão.

Já pensaram na quantidade de oportunistas que desataram a solicitar o lay-off para as suas empresas?

O resto é a burocracia.

Há leis, mas se as leis emperram a vida dos trabalhadores, de que servem?

4.

Os sons do silêncio.

Será que em silêncio nos entendemos, nos poderemos entender?

«De que me serve a razão se não existe o que eu ouço?», verso de um poema de Reinaldo Ferreira.

Assim como um arrepio.

5.

Chamam todos os nomes ao Estado, que é isto, aquilo, aqueloutro.

Mas em tempo de aflição é ao Estado que recorrem.

Não há excepções.

Lembram aquela gente que passa a vida a blasfemar, e quando se sentem aflitos invocam o nome do Senhor, ou lembrar Santa Bárbara só quando faz trovões.

6.

Os negros números:

Portugal regista 1.043 mortos.

Nas últimas 24 horas morreram 1.453 pessoas nos Estados Unidos, elevando para mais de 66 mil as vítimas mortais.
Há neste momento mais de um 1,3 milhões de norte-americanos infectados.
Nova Iorque continua a ser o estado com o maior número de número de vítimas mortais, ultrapassando as 18.500.


Itália: 28.884 mortos
Grã-Bretanha: 28.446 mortos
Espanha: 25.100 mortos
França: 24.729 mortos


Em todo o mundo já morreram 246.736 pessoas. 

7.


Todos os bichos caretas qua aparecem agora nas televisões a botar palavra desde as suas casas, aparecem com estantes cheias de livros atrás deles.

Marques Mendes que, aos domingos, dá catequese na SIC, provável tirocínio para candidato a Belém, tal como fez o seu companheiro de partido agora presidente, também tem uma estante de livros por cenário.

Durante semanas, porque é um calhamaço de 751 páginas via-se «José Saramago: Rota de Vida» de Joaquim Vieira.

Alguém lhe terá chamado à atenção que a coisa talvez não fosse muito bem vista entre as hostes do partido.

Hoje, em lugar do calhamaço sobre o José Saramago, aparece um calhamaço sobre Mota Pinto, que foi ministro do bloco central e dizia aos jornalistas que, em qualquer momento poderia sair do governo e tinha sempre a chave do carro no bolso do casaco.

Coisas saloias de gente a armar ao pingarelho.

2 comentários:

Seve disse...

Já pensaram na quantidade de oportunistas que desataram a solicitar o lay-off para as suas empresas?
Até a Igreja Católica, que lata...é bom não esquecer que o BMW do Padre Melícias não anda a água da torneira.

Sammy, o paquete disse...

Não lhes perdoais, senhor, porque eles sabem o que fazem, sempre fizeram, continuarão a fazer!