sexta-feira, 29 de maio de 2020

SARAMAGUEANDO


Na sua primeira edição, em 1982, Memorial do Convento perdia para Balada da Praia dos Cães de José Cardoso Pires. Em 1984 Amadeo de Mário Cláudio foi escolhido em vez de O Ano da Morte de Ricardo Reis. Dois anos depois, Jangada de Pedra perdeu para Um Amor Feliz de David Mourão Ferreira e em 1989 era a vez de História do Cerco de Lisboa perder para Fora de Horas de Paulo Castilho.

De modo algum estão em causa as obras que foram escolhidas, simplesmente o entusiasmo que os leitores tinham para com as obras de José Saramago, não era acompanhado por uma boa parte dos seus pares.

No dia 23 de Junho de 1992 sabia-se que José Saramago, finalmente  ganhava o Grande Prémio de Romance e Novela  com O Evangelho Segundo Jesus Cristo.

À quinta foi de vez mas sem unanimidade do júri.

José Saramago aceitou o prémio mas o dinheiro ia para os PALOP.

O escritor explicou:

Vistas as circunstâncias – as recentes e as antigas -, e para não juntar o choque de uma recusa ao escândalo de uma exclusão, aceito este prémio sob condição de o seu valor ser usado na compra de autores portugueses contemporâneos a enviar aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) que estejam interessados em os receber.
Peço à APE, ao Pen Clube e à SPA o favor de se encarregarem da selecção das obras e do seu encaminhamento…

Saramagueano que sou, torno-me mais que suspeito na matéria, mas sempre adianto que, tanto com O Memorial do Convento como com O Ano da Morte de Ricardo Reis, houve tremenda injustiça., talvez alguma coisa mais, mas fiquemo-nos pela injustiça.

O editor Francisco Vale recordou:

 Houve uma edição em que estiveram em competição Balada da Praia dos Cães e o Memorial do Convento e José Cardoso Pires ganhou. Era o melhor?
 Essa é uma pergunta complicada porque fui bastante amigo do José Cardoso Pires, que foi meu sogro durante bastantes anos, e Balada da Praia dos Cães é um dos seus melhores romances. Eu gosto muito do Memorial do Convento, que para mim é de longe a melhor obra de José Saramago e é um dos grandes livros da literatura portuguesa de sempre: Portanto, tenho muita dificuldade retrospetiva em fazer justiça nesse caso. Além do mais, o Memorial do Convento criou uma das poucas personagens da literatura portuguesa que ficam - toda gente sabe quem é Blimunda. Que personagens mais há? A Sibila da Agustina talvez, o Delfim do Cardoso Pires, o Malhadinhas do Aquilino... Claro que há também as personagens criadas por Eça em Os Maias, Carlos da Maia e Ega, ou em A Relíquia, Teodorico Raposo, bem como as de Camilo no Amor de Perdição, Simão e Teresa, na Brasileira de Prazins e Maria Moisés, ou as que saíram do universo ficcional de Júlio Dinis e, muito antes dele, do teatro de Gil Vicente.

2 comentários:

Seve disse...

Apenas tremenda injustiça?

Um júri que não consegue "ler" que está perante duas das maiores obras da língua portuguesa e da humanidade (O Memorial do Convento - o mais belo livro que li até hoje- e O ano da morte de Ricardo Reis - um livro fantástico-) então, penso eu, não me parece que seja só uma questão de injustiça.

Para mim, claro, José Saramago é o maior escritor português depois de Camões!

Sammy, o paquete disse...

Fiquei-me pela injustiça.
Em gente morta não se deve bater muito. Corremos o risco de eles ressuscitarem!...