Há um belíssimo livro de Elio Vittorini com o título: Consideram-se Mortos e Morrem.
Numa entrevista ao Expresso, Maria João Seixas que tinha substituído João Bénard da Costa na direcção da Cinemateca Nacional, disse algo que me fez lembrar o livro de Vittorini.
O jornalista pergunta:
- Ainda sobre
África, um dia referiu que o animal que mais a impressionou foi o elefante.
Pela sua maneira de viver em grupo, de se sociabilizar…
Maria João responde:
E também porque nos dá uma grande lição de morte. A dignidade da morte é uma coisa que nos escapa. Os elefantes quando sentem que vão morrer escolhem um parceiro e afastam-se do grupo com ele. Podem andar os dois vários quilómetros em silêncio. A um dado momento o elefante que sabe que vai morrer encontra o seu cemitério, um círculo imaginário na terra queimada na savana, e estaca no perímetro. Trombeteia para o outro que lhe responde e vai-se embora. O elefante doente senta-se espera a morte. Sozinho. É muito bonito. Impressionante.
O livro do Vittorini termina assim:
O avô volta-se então, do limiar que alcançou entre as árvores. À sua direita, acende-se no céu já claro o olho vermelho do semáforo. Ele ergue a sua bengala e, agitando-a, diz-nos adeus; e a luz vermelha do semáforo apaga-se, volta a acender-se.
-Nós também somos elefantes – diz-nos a minha mãe.
E, dizendo isto, impede-nos de correr atrás do avô a fim de trazê-lo para casa. Volta a entrar na cozinha, nós entramos com ela, e, à luz eléctrica que empalidece com a claridade do dia, o seu rosto mostra-se sorridente.
- Não percebeis patavina – diz-nos – Não é o princípio da noite. É o fim.
Aponta-nos a hora do velho relógio de parede.
-São seis e meia, vedes? Já os operários atravessam o parque, dirigindo-se para o trabalho. Hão-de encontrá-lo e trazer-no-lo. Mas se lhe dá na telha, entretanto!...
Legenda: pormenor da capa, da autoria de Luís Jardim de
Considerem-se Mortos e Morrem.
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