Rosa do Mundo
Direcção Editorial: Manuel Hermínio Monteiro
Organização: Manuela Correia
Coordenação Editorial: Sara Oliveira, Gil de Carvalho, José
Alberto Oliveira
Capa e Concepçãp Gráfica: Manuel Rosa
Assírio & Alvim, Lisboa, Abril 2001
Paternidade
Homem só, diante do
mar inútil,
À espera da noite, à
espera da manhã.
As crianças vêm
brincar, mas este homem
Não vê brincar nenhuma
junto de si.
Grandes nuvens erguem
um palácio sobre as águas
Que todos os dias
desaba e ressurge, e põe cor
Nos rostos das
crianças. Sempre haverá o mar.
A manhã fere. Sobre
esta húmida praia
O sol rasteja,
agarrado às redes e às pedras.
Ao sol nublado, o
homem caminha junto
Ao mar. não olha as
lentas espumas
Que sem descanso
tentam escorrer na areia.
A esta hora as
crianças dormem ainda
Na tepidez da cama. A
esta hora, mulheres
Dormem nas suas camas.
Estariam a fazer amor
Se não estivessem sós.
O homem despe-se lentamente
E nu como as mulheres
longínquas entra no mar.
Depois, à noite,
quando o mar se encobre, ouve-se
O grande vazio debaixo
das estrelas. As crianças
Nas casas tingidas de
vermelho caem de sono,
Por vezes em lágrimas.
O homem, cansado de esperar,
Ergue os olhos para as
estrelas, que não ouvem nada.
A esta hora, há
mulheres a despir crianças
E a adormecê-las.
Também as há na cama,
Abraçadas a um homem.
Pela janela escura
Entra um sopro rouco,
e ninguém o escuta
A não ser o homem que
conhece todo o desprezo do mar.
Cesare Pavese
Tradução: Ernesto Sampaio
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