Nas suas Memórias, escreve Rómulo de Carvalho
que, apesar da morte de Alain Oulman, assinou a autorização para que o poema Ai Silvina, Ai Silvininha pudesse ser
musicado por Alain Oulman, e comentou:
«… mas nada mais soube a tal respeito».
Tanto quanto é
possível saber, nunca apareceu uma gravação de Amália Rodrigues a cantar, com
música de Alain Oulman, o poema de António Gedeão.
Mas é provável que
exista.
Não nos podemos
surpreender porque volta e meia deoparamos com antigas gravações de Amália
feitas para a Valentim de Carvalho e saídas de um qualquer baú sem fundo, como
o de Fernando Pessoa.
Mas a música de Alian
Oulman existe mesmo.
Em Abril de 2013,
Camané, num concerto realizado no Centro Cultural de Belém, em que participaram
Mário Laginha, Carlos Bica e os Dead
Combo, cantou Ai Silvina, Ai Silvininha
com música de Alain Oulman.
Percorrendo o You Tube, não consegui encontrar a
interpretação do Camané.
Ela anda por lá, mas lê-se
que, de momento, não é possível processar o pedido.
De qualquer forma,
fica o poema de António Gedeão, tirado de Poesias
Completas:
Lindos olhos tem Silvina,
lindas mãos Silvina tem,
e a cintura de Silvina
é fina como o azevém.
Em Silvina tudo exala
um cheiro de coisa fina,
mas o que a nada se iguala
é a fala de Silvina.
A doce voz de Silvina
é como um colchão de penas,
é um fio de glicerina,
um vapor de águas serenas.
― Porque não cantas, Silvina?
Se a tua voz é tão doce
talvez cantada que fosse
mais doce que a glicerina.
Porque não cantas, Silvina?
― Não me apetece
cantar
e muito menos para
ti.
Eu sou nova, tu és
velho,
já não és homem
para mim.
― Não me tentes, Silvininha,
que eu já não te olho a direito.
Sou como um ladrão escondido
na azinhaga do teu peito.
― A azinhaga do meu peito
corre entre duas
colinas.
O ladrão do meu
amor
tem pé leve e
pernas finas.
― Canta, canta, Silvininha,
uma canção só para mim.
Dar-te-ei um lençol de estrelas,
uma enxerga de alecrim.
― Deixa o teu corpo
estendido
à terra que o
há-de comer.
A tua cama é de
pinho,
teus lençóis de
entristecer.
― Canta, canta, Silvininha,
como se fosse para mim.
Dar-te-ei um escorpião de oiro
com um aguilhão de marfim.
― Não quero o teu
escorpião,
nem de ouro nem de
prata.
Quero o meu amor
trigueiro
que é firme e não
se desata.
― Pois não cantes, Silvininha,
se é essa a tua vontade.
Canto eu, mesmo assim velho,
que o cantar não tem idade.
Hás-de tu ser morta e fria,
cem anos se passarão,
já de ti ninguém se lembra
nem de quem te pôs a mão.
Mas sempre há-de haver quem cante
os versos desta canção:
Ai Silvina, ai Silvininha,
Amor do meu coração.
Legenda: Camané
1 comentário:
"Ai Silvina, Silvininha", por outro lado, é o regresso de Camané ao baú mágico que lhe foi depositado nas mãos por Nicolas Oulman, filho do homem que revolucionou o percurso de Amália, Alain Oulman. Depois de ter retirado dessa gaveta forrada a ouro "Sei de Um Rio", Camané não resiste a mais um belo acréscimo à obra fadista de Oulman, sendo que não se esgotam aqui os temas por desvirginar. Tanto assim que Camané não esconde a vontade de juntar todo este manancial de Oulman num álbum inteiramente dedicado ao compositor.
Gonçalo Frota / Público, 26/04/2013
A propósito da compilação "O Melhor 1995-2013" de Camané
PS: A editora de Amália tem muitos temas inéditos por lançar pode ser mais um.
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