Venho olhar a tua quinta
que é esta longa seara
de pedra. E vejo ainda
desarmada a mão avara
que vai disparar a bala
rente ao ouvido da Manhã.
A luz da aurora é a fala
duma língua temporã
que primeiro nada lavra
e é uma charrua de tábua,
mas quando se faz palavra
é um pomar a tua água.
Chego-me para olhar a quinta
como se olhá-la adubasse
essa terra tão faminta
da clareza da sintaxe.
Vê agora a tua mesa
se é que a luz ainda por vir
te deixa ver a portuguesa
maneira de a servir.
O que nela se nos dá
sobra a ausência da toalha
é a pedra que aqui há
como única virtualha.
E a mão deflagra o gatilho
secreto do amanhecer.
As palavras são o rastilho
do lume que vai nascer.
Toando ao ouvido que ensurdece
o urgentíssimo arcabuz
que da noite lenta tece
uma bengala de luz.
Alexandre Pinheiro Torres em Ilha do Desterro
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