No dia 25 de Abril,
Manuel Freire fez 80 anos.
Não é por ser um
número redondo, que nos leva a trazer aqui este rapaz nascido em Vagos, é antes
o registo de um tipo discreto, sereno, a viver longe dos holofotes, que merece
o lugar de relevo que ocupa, não só na música popular portuguesa, mas no que
ele , com a sua viola, «toco
pessimamente», as suas canções contribuiu para zarpar os caminhos que levaram
ao 25 de Abril.
Quando, em 1969, Manuel Freire aparece no Zip-Zip, a cantar Pedra Filosofal de António Gedeão, não era totalmente um desconhecido. Era um companheiro de viagem, dos que, país fora, andavam por sociedades recreativas a dizer, a quem os quisesse ouvir, que haveria de chegar o dia das surpresas.
Em 1969 publicara o EP Manuel Freire Canta Manuel Freire, que inclui Livre, poema de Carlos de Oliveira, que passámos a saber de cor e que, por aqueles dias, em qualquer circunstância, se cantava ou murmurava.
Depois um outro EP, Trovas,Trovas,Trovas, que inclui o belíssimo poema de Daniel Filipe, Lutaremos Meu Amor disco que, de imediato, foi apreendido pela PIDE.
Uma simples mensagem: “na aparência sozinhos multidão na verdade, lutaremos meu amor", punha o regime a tremer.
Claro que a passagem pelo Zip-Zip
projecta Manuel Freire para um outro tipo de público, e muito mais gente
ficará, então, a saber que o sonho comanda a vida, que o mundo pula e avança.
Manuel Freire sobre a poesia de António Gedeão:
«A poesia dele tem um ritmo próprio. Para já, é extremamente clara. Não
é daqueles poetas que a gente tem de ler o poema três vezes para perceber o que
eles querem dizer. Isso não os torna nem piores nem melhores, torna-os
diferentes. O Gedeão não: lê-se à primeira e percebe-se o que quer dizer. E
como tem um ritmo, torna mais fácil musicar as coisas. De maneira que foi isso
que eu descobri.»
António Gedeão, ou
Rómulo de Carvalho, nas suas Memórias
sobre Manuele Freire:
«Eu tenho comigo trinta discos onde foram gravadas
canções, feitas por diversos cantores de maior ou menor fama. Sobre poemas
meus. Desses trinta discos dois deles foram-me oferecidos pelos seus criadores.
Os restantes vinte e oito (e não estou em erro) foram comprados por mim quando,
por acaso, os fui encontrando nas montras das casas de discos por onde passava.
O que mais se notabilizou nestas andanças foi o Manuel
Freire, um rapaz com voz agradável e talento musical. Quando depois o conheci,
e conversei com ele, disse-me que ficara muito impressionado quando leu os meus
poemas publicados, pelo seu sentido musical. Particularmente leu a Pedra
Filosofal e, espantosamente, impelido pelo ritmo do texto, começara a lê-la e
a trauteá-la. Daí lhe nasceu, de imediato a música que tão popular se tornou.
Houve quem dissesse no jornal que a Pedra Filosofal marcara toda uma geração.
Tenho comigo cinco discos do Manuel Freire onde ele canta, com música sua, não só a “Pedra Filosofal” como também o “Poema da malta das naus”. Devo-lhe muito. Suponho que foi pela sua actuação que a minha poesia conseguiu tão grande êxito generalizado.»
O CANTIGUEIRO
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