Carta de António José
Saraiva, desde Amsterdão, 16 de Fevereiro de 1973, para Óscar Lopes onde volta
à divinização de Agustina Bessa-Luís («A
Agustina é infinitamente mais «realista» que o Redol, porque os livros do redol
são mortos e os da Agustina vivos. Quando a leio sinto-me à beira de um precipício,
e por isso não aguento lê-la mais que uma dúzia de páginas seguidas») e um
breve comentário sobre as colónias portuguesas:
As minhas correcções à parte da Agustina visaram sobretudo a dar-lhe o
lugar que ela merece e que não é o de uma simples «escritora feminina». A
Agustina é um dos dois grandes escritores mundiais que Portugal produziu neste
século e está a ser vítima de uma certa mesquinhez nacional, bem ajuizadinha,
cujos grandes símbolos são no nosso século o Teófilo e o Salazar. Não há dúvida
que perdemos nos últimos séculos uma certa capacidade de ver grande como
tiveram o Camões, o Vieira, o Oliveira
Martins, o Pessoa e até certo ponto o Sérgio. Secou-se-nos o grãozinho de
mostarda. Dizer que os últimos livros dela não são tão bons como os primeiros é
fugir à questão. E quanto a não ser traduzida, é lá com os tradutores e os
comerciantes de livros.
Quanto às colónias só há uma alternativa: ou liquidar tudo, limpando
saí as mãos (estado branco independente, ou negociações com os movimentos, ou
outra qualquer solução que entregue aquilo ao diabo); ou então procurar criara
uma sociedade em que os brancos e pretos convivam. Mas esta segunda solução
parece cada vez mais impossível. Somos um país pequeno, pobre, resignado ao
destino que não conhecemos nem queremos conhecer! Isso dói-me.
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