segunda-feira, 17 de setembro de 2018

É ASSIM, AQUI NA TERRA?


O grande passatempo destes fregueses do bar parece ser as apostas: apostas sobre os mínimos acontecimentos do dia a dia. Por exemplo, um diz: «Vamos apostar quem chega primeiro hoje aqui ao bar: o doutor Marne ou o comissária Gorin?». E outro: «E o doutor Marne quando chegar, para não esbarrar com a ex-esposa, o que vai fazer: pôr-se a jogar flipper ou a preencher o totobola?»
Numa existência como a minha, não se pode fazer previsões: nunca sei o que me pode suceder na próxima meia hora, não consigo imaginar-me com uma vida toda feita de reduzidas alternativas bem limitadas, sobre as quais se pode fazer apostas: ou assim ou assado.
- Não sei – digo em voz baixa
- Não sei o quê? – pergunta-me ela.
É um pensamento que creio poder também dizer e não guardá-lo só para mim como faço com todos os meus pensamentos, dizê-lo à mulher que está aqui ao meu lado ao balcão do bar. A da loja de peles, com quem há um bom bocado me apetece meter conversa. – É assim, aqui na terra?
- Não, não é verdade – responde-me e eu já sabia que me responderia assim. Aforma que não se pode prever nada, tanto aqui como em toda a parte: é certo que todas as noites a esta hora o doutor Marne fecha o consultório e o comissário Gorin acaba o seu turno de serviço na esquadra da polícia, e passam sempre por aqui, primeiro um ou outro, mas não quer dizer nada!
- No entanto, ninguém parece duvidar de que o doutor tentará evita a ex-senhora Marne – digo-lhe.
- A ex-senhora Marne sou eu – responde ela. – Não ligue ao que dizem.


Legenda: pintura de Édouard Manet

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