sábado, 15 de setembro de 2018

OLHAR AS CAPAS


Júlio César

Shakespeare
Tradução: Dr. Domingos Ramos
Lello & Irmão Editores, Porto s/d

António:
Amigos romanos, compatriotas, prestai-me atenção. Vim para sepultar César, não para o louvar. O mal que os homens fazem vive depois deles. O bem que puderam fazer permanece quase sempre enterrado com os seus ossos. Que seja assim para César. O nobre Bruto disse-vos que César era um ambicioso. A ser isso verdade, a culpa era grave, e César dolorosamente a expiou. Com a autorização de Bruto e dos outros (porque Bruto é um homem honrado, assim como todos os outros são honrados) venho falar nos funerais de César. Ele era, para mim, um amigo fiel e justo. Mas Bruto diz que ele era ambicioso, e Bruto é um homem honrado. Ele trouxe a Roma numerosos cativos, cujos resgates encheram os cofres públicos. Era César ambicioso por isso? Quando o pobre gemeu, César chorou. A ambição deveria ser dum estofo mais rude. Mas Bruto diz que ele era um ambicioso, e Bruto é um homem de bem. Todos vós vistes, nas Lupercais, que três vezes uma coroa real lhe foi apresentada, e que três vezes ele a recusou. Era isso ambição? Contudo, Bruto diz que ele era um ambicioso, e não há dúvida que Bruto é honesto. Eu não falo para reprovar o que Bruto disse; mas estou aqui para dizer o que sei. Todos vós o amáveis antigamente, e não era sem motivo. Por que, pois, não o pranteais hoje? O que é que vos impede disso? Ó razão, onde estás tu, razão? Refugiaste-te nas brutas feras, e os homens ficaram sem ti! Sede indulgentes para comigo. O meu coração está no esquife de César; e vejo-me obrigado a calar-me até recuperar ânimo.

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