Terminamos hoje a
passagem de olhos que fizemos pela entrevista que Luiz Pacheco deu a Carlos
Quevedo e Rui Zink, publicada na Revista K
de Julho de 1992 e retirada de OCrocodilo Que Voa:
Os seus textos metem
todos a primeira pessoa. É a opção estética do libertino?
Se escrevo um livro e não ponho ali o «eu» e não dou referências pessoais, o texto perde a qualidade de exemplar. É a tal coisa, o libertino faz da sua vida um espectáculo porque pensa que é exemplar, que contém uma lição para as outras pessoas: quer dizer, o libertino procura libertar.
Acha então que é mais coerente que a maior parte das pessoas?
Ah, sim, estou convencido disso. Essa coerência pode ser estupidez, pode ser por diminuição de faculdades… Também não vamos agora pôr nisso tudo quanto é positivo. Por exemplo, eu acho que se tivesse andado de avião e feito viagens ao estrangeiro tinha uma dimensão do mundo muito mais rica do que a que tenho. Mas também eu fui lá abaixo à cadeia, fui ao asilo, fui ao hospital, estive nos malucos, lá por causa do álcool, internado. No filme para a RTP, se vocês o tornarem a ver, reparam que há duas coisas que são escondidas – a parte homossexual e a alcoólica. Bem, a alcoólica não está assim tão fantasiada, porque de repente vê-se que eu estou com uma grande bebedeira.
Não se notava.
Sim notava-se, nota-se. Agora a parte homossexual é que deu para aí, porque eles, o Mário Lindolfo, num almoço aqui em Setúbal, de repente aludiu: «Essa coisa do libertino tentar engatar o magala, isso afinal de contas passou-se contigo ou era ficção?» E deu-me para responder isto: «Tudo o que se escreve é invenção, não podes tirar conclusões daí» e ele recuou. Essa parte aí fui eu que escamoteei. A parte do alcoolismo foi a doutora lá do Júlio de Matos que exigia que eu fizesse uma declaração em como ele podia dar depoimentos. Ora eu estive lá internado, no Júlio de Matos, por causa do álcool. É assim, eu tenho uma dose de psicopatia muito grande, a minha mãe via Deus, via o Diabo. Tive um tio, que eu nunca cheguei a ver vivo, que esteve 55 anos internado no hospital. Tenho uma carga hereditária psicopata grande. De maneira que o álcool dá-me para os disparates, não é por acaso. E de repente bebo duas coisas ou três e faço uns disparates que as pessoas que beberam três whiskies, ou quatro ou seis, não fazem, porque isto ataca-me cá a mioleira, ataca-me cá a telha. São as chamadas pulsões. Por exemplo, eu tenho medo de me chegar ali àquela janela, que é relativamente baixa, mas eu não me chego a ela. É um bocado o instinto de conservação. Tenho medo de perder o controlo e mandar-me.
Se escrevo um livro e não ponho ali o «eu» e não dou referências pessoais, o texto perde a qualidade de exemplar. É a tal coisa, o libertino faz da sua vida um espectáculo porque pensa que é exemplar, que contém uma lição para as outras pessoas: quer dizer, o libertino procura libertar.
Acha então que é mais coerente que a maior parte das pessoas?
Ah, sim, estou convencido disso. Essa coerência pode ser estupidez, pode ser por diminuição de faculdades… Também não vamos agora pôr nisso tudo quanto é positivo. Por exemplo, eu acho que se tivesse andado de avião e feito viagens ao estrangeiro tinha uma dimensão do mundo muito mais rica do que a que tenho. Mas também eu fui lá abaixo à cadeia, fui ao asilo, fui ao hospital, estive nos malucos, lá por causa do álcool, internado. No filme para a RTP, se vocês o tornarem a ver, reparam que há duas coisas que são escondidas – a parte homossexual e a alcoólica. Bem, a alcoólica não está assim tão fantasiada, porque de repente vê-se que eu estou com uma grande bebedeira.
Não se notava.
Sim notava-se, nota-se. Agora a parte homossexual é que deu para aí, porque eles, o Mário Lindolfo, num almoço aqui em Setúbal, de repente aludiu: «Essa coisa do libertino tentar engatar o magala, isso afinal de contas passou-se contigo ou era ficção?» E deu-me para responder isto: «Tudo o que se escreve é invenção, não podes tirar conclusões daí» e ele recuou. Essa parte aí fui eu que escamoteei. A parte do alcoolismo foi a doutora lá do Júlio de Matos que exigia que eu fizesse uma declaração em como ele podia dar depoimentos. Ora eu estive lá internado, no Júlio de Matos, por causa do álcool. É assim, eu tenho uma dose de psicopatia muito grande, a minha mãe via Deus, via o Diabo. Tive um tio, que eu nunca cheguei a ver vivo, que esteve 55 anos internado no hospital. Tenho uma carga hereditária psicopata grande. De maneira que o álcool dá-me para os disparates, não é por acaso. E de repente bebo duas coisas ou três e faço uns disparates que as pessoas que beberam três whiskies, ou quatro ou seis, não fazem, porque isto ataca-me cá a mioleira, ataca-me cá a telha. São as chamadas pulsões. Por exemplo, eu tenho medo de me chegar ali àquela janela, que é relativamente baixa, mas eu não me chego a ela. É um bocado o instinto de conservação. Tenho medo de perder o controlo e mandar-me.
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