Já há muito que
andava para colocar aqui um texto sobre o Billy Wilder’s Café-Bar em
Berlim.
Tinha a certeza que existia uma fotografia da procura que
fizéramos para localizar o hotel do «One, Two, Three», onde acontece uma das grandes cenas do mundo de Billy Wilder, que só se tornara realizador
para proteger os seus argumentos.
Procurei-a longamente sem qualquer ponta de sucesso.
Agora, com todo o tempo do mundo, graças ao Covid-19,
apareceu-me, juntamente com outra tralha, dentro duma caixa de charutos.
Lá estou eu a olhar para a fachada do «Easy Side Hotel»,
apenas a olhar, o que admitimos ser o Grande Hotel Potemkin que aparece no
filme.
Cabe dizer que, no
tocante a cinema, e não só, se o Luís Miguel Mira, depois de dar todas as
voltas, e mais uma, não consegue encontrar o que procura, não vale a pena fazer
quaisquer outros esforços.
João Bénard da Costa diz-nos que o interior do Grande
Hotel Potemkin é decalcado de um hotel por ali existente, que nos tempos da
juventude de Wilder se chamava Grand Hotel Bismark e nos anos de Hitler se
chamava Grande Hotel Goering.
Qual será o novo nome do Hotel nos dias de hoje?
O «Easy Side Hotel» cuja fachada se vê na fotografia?
E estávamos no exacto, ou aproximado, local?
Billy Wilder, a
equipa de filmagens só se deram conta de tal facto pela manhã.
Agora pouco importa, o que importa realmente é esse
espantoso filme de Wilder, que ao tempo, tempo de guerra fria, ninguém gostou,
ninguém o olhou com olhos de ver, chegando a classifica-lo como «abjectamente
reacionário».
A última vez que vi «Um, Dois, Três», foi na sala Dr.
Félix Ribeiro da Cinemateca – quando voltarei a entrar na Cinemateca? -, na tarde do dia 28 de Janeiro de 2003 e guardo
a folhinha assinada pelo João Bénard da Costa, que me serve de fonte.
O muro de Berlim
começou a ser erigido na noite de 13 de Agosto de 1961.
Muita coisa aconteceu durante a rodagem do filme. Quando
chegaram para a as primeiras filmagens ainda se ia de um lado para o outro,
quando as filmagens chegaram ao fim o tal muro já estava erguido e,
naturalmente viria a ser afectado
«Quando via matarem
os refugiados que tentavam fugir de leste para oeste na vida real, parecia-me
que ia ser difícil que as pessoas aceitassem uma comédia situada em tal décor. Os realizadores são muito
vulneráveis a esta espécie de riscos. Uma situação, um clima político muda e as
coisas deixam de ser as mesmas no fim das filmagens do que eram quando se
começaram.»
Bénard da Costa é de opinião que todos esses tempos
afectaram o filme mais do que Wilder poderia supor.
«Os alemães odiaram e acharam difícil de acreditar que um
«alemão» pudesse retratar assim o seu povo e o país onde vivera em jovem. Não
falo dos russos porque, obviamente, jamais o viram. À época «One, Two, Three»
foi o único filme de Wilder que ninguém defendeu e, ainda hoje, é dos mais mal
conhecidos e estudados da sua obra.»
A folhinha da Cinemateca conclui:
«Em 1961, ninguém entendeu Wilder. Em 2003 – ai de nós,
entendemo-lo bem de mais».
O resto é lembrar a fabulosa sequência no tal hotel, cena
antológica das muitas de Billy Wilder, em que Lilo Pulver, no papel de Ingeborg, se mostra esplendorosa e
escultural, com aquele justinho vestido às bolinhas vermelhas, o filme é a
preto e branco, mas terão de ser vermelhas as bolinhas, numa dança maluca, em
cima da mesa cheia de champanhe, vodka e caviar, rodeada por um turba de
bêbados, tão louca, louca a dança, o frenesim infernal, que o retrato de
Krustchev baloiça e cai, revelando que escondia o retrato de Estaline.
Simplesmente fabuloso.
Billy Wilder nunca gostou de rever os seus filmes.
«Só me apetece é agarrar naquilo e mudar tudo», e
sorriu. «É como voltar a encontrar uma rapariga com quem se dormiu quinze anos
atrás. Olha-se para ela e pensa-se ”Deus meu, dormi mesmo com ela”?»
«Quanto Mais Quente talvez seja o meu melhor filme, por ser o que
tem menos erros.»
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