segunda-feira, 13 de abril de 2020

DIÁRIO DOS DIAS DIFÍCEIS


Segunda-feira de Pascoela.

Depois de um domingo-de-páscoa-quase-paraíso, regressámos ao calvário da chuva, do cinzentismo.

A chuva faz falta e se agora nem de casa podemos sair, que chova.

Ouçamos o som da chuva a cair.

Saibamos receber a chuva porque os campos dela precisam, enquanto vamos lembrando aquele poema do José Gomes Ferreira e como música para hoje, ficamos com Morning Mood de Peer Gynt, composto por Edvard Grieg para a peça, com o mesmo nome, de Henrik Ibsen, que não nos fala de chuva, antes do nascer do sol no deserto.

Chove...

Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?

Chove...

Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.


1.

Por vezes, ficamos com a ideia de que não há país mais provinciano que o nosso.

Não é verdade.

Há muitos mais.

Serão todos?

Deparamo-nos com o primeiro-ministro Boris Johnson, publicamente, a agradecer ao enfermeiro português que dele tratou enquanto esteve hospitalizado nos cuidados intensivos.

Desconheço se o enfermeiro teve alguma reacção, mas gostava que tivesse dito que foi para isso que estudou e o ensinaram, e tanto acompanharia na doença sua excelência, como um qualquer sem abrigo da cidade de Londres.

Cada um de nós é a pessoa mais importante para si próprio. O orgulho pelo nosso trabalho, o ser solidário com os outros.

Não sei se disse, fujo dos pormenores, mas quase ao mesmo tempo me disseram que Marcelo Rebelo de Sousa já falou com Luís Pitarma, o enfermeiro, e sublinhou o especial reconhecimento apresentado por Boris

E o Cristiano Reinaldo, também já falou com o enfermeiro Luís?

2.

Título do Jornal de Notícias:

 «Profissionais de saúde são dos mais mal pagos da Europa.»

Não só os profissionais de saúde, todos os trabalhadores, exceptuam-se os do costume, de há muito, são dos mais mal pagos na Europa.

3.

Um total de 761 reclusos já foram libertados em todo o país, no âmbito das normas excepcionais e de perdão de penas aplicadas à população prisional devido à pandemia.

4.

Os Número negros:

No mundo, o número de mortos cifra-se em 118.984 mortes.

Portugal regista 535 mortes.

Em Itália são 20,465 mortes, em Espanha 17.849 mortes, em França 14.967 mortos.

No Reino Unido já morreram 11.329 pessoas.

Os fornecedores das funerárias do país avisaram que não têm stocks de sacos para cadáveres. A espera para a compra destes materiais vindos de fora é de semanas. O sistema de saúde britânico diz ter material suficiente, mas os trabalhadores avisam que estão a embrulhar corpos em lençóis.

Os Estados Unidos elevaram o número de mortos para 22.020.

A 28 de Fevereiro, o irresponsável Donald Trump dizia:

«Dentro de dias, os 15 casos que há nos EUA vão ficar reduzidos a zero.»

Trump ameaça despedir Anthony Fauci, especialista em doenças infeciosas, por, mais de uma vez, ter dito que se as restrições tivessem sido impostas mais cedo, mais vidas teriam sido salvas.

5.

«Cansa-me tanto, escrever. Cansa-me porque escrever não é recapitular a memória: é destruir a memória. A memória é a última coisa que nos sobra, quando estamos assustados, tão, que recompor a memória é uma grande falta de pudor. A memória é uma autobiografia às avessas, que oculta coisas secretas.
Não sei se alguém vai entrar por aquela porta, trazida por um perfume, um som, uma esperança. Sei que todos nós fomos lançados para destinos contrários.»

Baptista-Bastos em O Cavalo a Tinta-da-China

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