quinta-feira, 2 de abril de 2020

DiÁRIO DOS DIAS DIFÍCEIS


Não é impunemente que se nasce em Lisboa, frente a este rio que é um mar.

Lembro-me do Mário Castrim: «Sofro desse mal ilhavense: quando estou muito tempo sem ver o mar, sufoco. Nasci com esta droga no sangue, morrerei com ela.»

Há quantos dias não vejo o mar, não oiço o grito das gaivotas?

Tenho pena de morrer sem ver o mar, diziam as velhas no findar do dia, frente ao borralho, preparando o jantar. Muitas, só depois de por aqui acontecer uma revolução, conseguiram ver o mar.

A tarefa de conhecer o barco e o mar em que vamos, ou aquele verso num poema de António Reis: «há sempre um rapaz triste em frente a um barco».

De mar em mar, desaguamos em Claude Debussy, no seu «La Mer», desaguamos à beira do sonho.

Qual sonho?


 1.

O ministério dos negócios estrangeiros pede aos compatriotas que trabalham ou residam no estrangeiro que, pela Páscoa, não venham visitar os familiares e amigos não visitem, pela Páscoa. A pandemia a isso obriga. Temos que nos proteger uns aos outros.

Depois de o prolongamento do estado de emergência ter sido aprovado na Assembleia da República, ficou a saber-se que durante o período de Páscoa não vão ser permitidas deslocações para fora do concelho de residência, excepção feita para pessoas que forem trabalhar e entre os dias 9 e 13 de Abril estarão encerrados os aeroportos nacionais. Uma medida excecional", que não abrange voos de carga, de natureza humanitária, de repatriamento ou de natureza militar. 


2.

Seis dólares por hora e equipamento de proteção individual é o que Nova Iorque oferece aos presos de Rikers Island para cavar valas comuns.
Ideia já constava de plano contra surto de gripe em 2008.

Se Nova Iorque é o epicentro do surto de coronavírus, mais de 38 mil infectados e mais de mil mortos, que está a matar milhares de pessoas nos Estados Unidos, pode-se dizer que a prisão de Rikers Island, a maior prisão do estado de Nova Iorque, é mesmo o epicentro da catástrofe humanitária. A taxa de infeção entre os reclusos e os funcionários daquela prisão isolada é sete vezes superior à taxa da cidade de Nova Iorque.

3.

O número de pedidos de subsídio de desemprego nos Estados Unidos atingiu os 6, 6 milhões de trabalhadores.

4.

A TAP publicou um vídeo em que, aos 75 anos, se despede dos portugueses com um «até já!»

Será que abandonamos as grandes discussões sobre a situação do novo aeroporto que iria desafogar a Portela: Alcochete, Montijo, Marrazes-de-Baixo?

Imagens do aeroporto da Portela no dia de hoje, mostram-no quase vazio… uma náusea de tristeza passeia-se pelos corredores, pelos átrios… o silêncio…

5.

Semanas atrás, quantos novos restaurantes abriam em Portugal?

6.

Aterradoras as fotografias e imagens que estão a chegar da Índia.

A miséria total num país que alberga as maiores fortunas do mundo.

7.

A companhia aérea British Airways vai colocar 28 mil funcionários em situação de desemprego parcial, devido à crise causada pela pandemia de covid-19, que paralisou o sector.

8.

A Altice Portugal, em comunicado, lamentou que não tenha siso ouvida ou notificada no processo de suspensão das Ligas de futebol português, devido ao Covid-19.

9.

Numa só semana, a venda de livros caiu 65,8% devido à pandemia,

A situação de desespero coloca em risco todo o sector livreiro mas, acima de tudo, as pequenas livrarias, os pequenos editores.

10.

Os negros números:

Itália

13.915 mortes

Espanha

10.348 mortes

Estados Unidos

5.137 mortes

China

3.318 mortes

Irão

3.160 mortes

França

5.387 mortes

Grã-Bretanha

2.921 mortes

Bélgica

1.011 mortes

Portugal

209 mortes

No Mundo

52.771

11.

«Acredito que se calhar, aqui, estou mais protegida do que aí fora. Mas a protecção não é conforto nenhum. Por causa da solidão. Isto é paredes brancas, o chão liso o dia inteiro – eles são muito cuidadosos com a limpeza – e às vezes a vida com um bocadinho de sujidade é melhor.»

Depoimento de uma professora reformada, a viver num lar, publicado no Público.

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