Neste tempo parado no
tempo, o tempo dá para tudo: pensar em chocolates, numa sopa de tomate com ovos
escalfados à alentejana, prometida há muito à Aida, lembrar coisas de que nunca
se pensa que nos iríamos lembrar tanto, a importância da memória, os suores
frios quando topamos que a memória começa a tropeçar, a angústia de perder a
memória.
Porque a memória
segura um edifício que é a maneira como olhamos a rua onde nascemos, onde
corremos, demos e levámos porrada, de onde olhamos o mundo, de onde tudo se
olha.
Porque somos aquilo
que fomos fazendo e a recordação do que fizemos.
O tempo agora é o
tempo de não termos medo de perder tempo.
A memória do tempo.
No tempo da memória. Para que a memória não esqueça.
Chegar a um poema de
Jorge de Sena, um lindíssimo e dramático poema, palavras de quem, muito tarde
na noite, se sente cansado, ouve a sonata para violino e piano de César Franck,
sente que o cansaço não o larga e antevê o profundo silêncio do que há-de
chegar.
«É tarde, muito tarde da noite,
trabalhei hoje muito, tive de sair, falei com vária gente,
voltei, ouço música, estou terrivelmente cansado.
Exactamente terrivelmente com a sua banalidade
é o que pode dar a medida do meu cansaço.
Como estou cansado. De ter trabalhado muito,
ter feito um grande esforço para depois
interessar-me por outras pessoas
quando estou cansado demais para me interessarem as pessoas.
E é tarde, devia ter-me deitado mais cedo,
há muito que devera estar a dormir.
Mas estou acordado com o meu cansaço e a ouvir música.
Desfeito de cansaço,incapaz de pensar, incapaz de olhar,
totalmente incapaz até de repousar à força de cansaço.
Um cansaço terrível
da vida, das pessoas, de mim, de tudo.
E fumo cigarro após cigarro no desespero
de estar tão cansado. E ouço música
(por sinal a sonata para violino e piano de César Franck,
e depois os Wesendonck Lieder)
num puro cansaço de dissolver-me
como Brunhilda ou como Isoldano que não aceitarei nunca,
l' amor che muove il sole e l' altre stelle.
Nada há de comum entre esse amor de que estou cansado,
e o outro que não ama, apenas queima e passa ,
e de cuja dissolução no espaço e no tempo em que vivo
estou mais cansado ainda. Dissolvam-se essas damas
que eram princesas ou valquírias, se preferem, no eterno.
Eu estou cansado de não me dissolver
continuamente em cada instante da vida,
ou das pessoas, ou de mim, ou de tudo.
Qu' ai-je à faire de l' eternel? I live here.
Non abbiamo confusion. E aqui é que morrerei
danado de cansaço, como hoje estou
tão terrivelmente cansado.»
trabalhei hoje muito, tive de sair, falei com vária gente,
voltei, ouço música, estou terrivelmente cansado.
Exactamente terrivelmente com a sua banalidade
é o que pode dar a medida do meu cansaço.
Como estou cansado. De ter trabalhado muito,
ter feito um grande esforço para depois
interessar-me por outras pessoas
quando estou cansado demais para me interessarem as pessoas.
E é tarde, devia ter-me deitado mais cedo,
há muito que devera estar a dormir.
Mas estou acordado com o meu cansaço e a ouvir música.
Desfeito de cansaço,incapaz de pensar, incapaz de olhar,
totalmente incapaz até de repousar à força de cansaço.
Um cansaço terrível
da vida, das pessoas, de mim, de tudo.
E fumo cigarro após cigarro no desespero
de estar tão cansado. E ouço música
(por sinal a sonata para violino e piano de César Franck,
e depois os Wesendonck Lieder)
num puro cansaço de dissolver-me
como Brunhilda ou como Isoldano que não aceitarei nunca,
l' amor che muove il sole e l' altre stelle.
Nada há de comum entre esse amor de que estou cansado,
e o outro que não ama, apenas queima e passa ,
e de cuja dissolução no espaço e no tempo em que vivo
estou mais cansado ainda. Dissolvam-se essas damas
que eram princesas ou valquírias, se preferem, no eterno.
Eu estou cansado de não me dissolver
continuamente em cada instante da vida,
ou das pessoas, ou de mim, ou de tudo.
Qu' ai-je à faire de l' eternel? I live here.
Non abbiamo confusion. E aqui é que morrerei
danado de cansaço, como hoje estou
tão terrivelmente cansado.»
1.
Julio Anguita, militante espanhol da Esquerda Unida:
«Muitos vão ter
que apertar o cinto, o problema é que há gente já que nem cinto tem.»
2.
Pelo menos 33.366
empresas já se candidataram ao ‘lay-off’ simplificado, o que correspondente a
um universo de 556.751 trabalhadores.
3.
A Organização
Internacional do Trabalho considera que o mercado de emprego está a enfrentar
com a pandemia do coronavírus a sua crise mais grave desde a Segunda Grande
Guerra. Há 1,25 mil milhões de trabalhadores em risco elevado de despedimento
ou de redução salarial.
4.
«Os Richmonds estão
inundados e a electricidade foi-se. Deus está-nos a testar e eu por mim quero
estar preparada. Onde é que está a vodka?»
- Diane, a personagem
de Elaine Strich em Setembro, filme
de Woody Allen.
5.
Os negros números:
Itália
17.127 mortes
Espanha
13.912 mortes
Estados Unidos
10.335 mortes
França
10.328 mortes
Grã-Bretanha
6.159 mortes
Irão
3.872 mortes
China
3.212 mortes
Holanda
2.101 mortes
Bélgica
2.035 mortes
Alemanha
1.983 mortes
Portugal
345 mortes
Mundo
81.200 mortes
«O medo nasce em
qualquer lugar, como erva daninha por dentro. O medo suporta tudo e cresce no
escuro até ser adulto, até ser do tamanho de um homem, e lhe tomar o corpo e
pensar por ele.»
Nuno Camarneiro em
Debaixo de Algum Céu
2 comentários:
Cheguei a este blogue, que desconhecia, por causa da etiqueta referente ao poeta António Reis e fiquei agradavelmente surpreendido com o que tenho lido.
Passarei a passar por cá.
Muito obrigado
Pedro Garcia
Obrigado pela visita.
Também pelas palavras.
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