quinta-feira, 30 de abril de 2020

AMANHÃ É DIA DE FESTA!


Está quase a bater a meia-noite do ainda 30 de Abril de 1974.

Se agora lhe perguntassem o que fez depois da madrugada por que esperava, diria que daí até ao 1º de Maio, necessariamente, terá dormido mas, do que lembra bem, é que andou num turbilhão vertiginoso ao ponto de dizer que esse dia 25 não foi um dia, foram mais: que vai desde 25 de Abril até ao primeiro 1º de Maio.

Dirá então que acontecesse o que acontecesse – e muita coisa iria acontecer - obviamente aquela festa de ilusões, aquele património, já ninguém lhe tirava. 

Mais tarde dirá aos filhos, aos netos que só quem andou naquela nave de loucos,  viveu aqueles tempos de miragens, perceberá o que foi o 25 de Abril. 

E não mais esquecerá aqueles dias luminosos em que tudo parecia ser possível.

Os jornais tentam dar notícia de tudo o que está acontecer, também do que virá. 

Já foi extinta a PIDE/DGS, a Legião e as Mocidades Portuguesas, o povo persegue os pides nas ruas e, entregando-os às forças militares, são encarcerados em Caxias, conhecem a casa, mas agora olham-na com uma perspectiva bem diferente, sabe-se que os funcionários públicos despedidos por motivos políticos serão reintegrados, começam a regressar mais exilados políticos, os desertores querem voltar e pedem amnistia, Tomaz, Caetano, e outros ministros, estão no Funchal a aguardar guia de marcha para o exílio, os trabalhadores tomam conta dos seus sindicatos, um decreto-lei determina que quem quiser sair do país só poderá levar 50 contos.
 
Mas neste dia de há 46 anos, uma notícia ressalta, quase única: a Junta de Salvação Nacional faz publicar o decreto-lei que determina que o 1º de Maio será feriado nacional.
 
Durante a ditadura, o 1º de Maio era um dia que trabalhadores e estudantes estavam impedidos de comemorar.

Mas com coragem e determinação, aqui e ali, sempre encontraram forma de o assinalar, se bem que sujeitos a brutal repressão: pedras e palavras de ordem contra bastões, espingardas, carros-de-combate-lança-tinta-azul.

A mudança ia acontecendo, lenta, lenta, lenta, éramos tão poucos.

E onde estava aquele gente que, no amanhã de há 46 anos, encherá as ruas transformando-as num imenso oceano.

Nesta noite, Sá Carneiro será entrevistado pelo Telejornal. 

Dirá ao povo para, no 1º de Maio, actuar disciplinada e ordeiramente.

No dia seguinte, no Canal da Crítica do Diário de Lisboa, Mário Castrim escreverá que compreende a preocupação dos políticos, mas adianta:
 
«Depois, amigo Sá Carneiro, deixe lá o povo manifestar à vontade por esse país fora. Deixe-o mostrar a sua alegria, a sua vitalidade. Deixe-o à vontade matar a fome do pão que durante 50 anos lhe negaram. Tempos virão de trabalho e organização. Mas que se deixe, agora, que o Povo Português seja dono das ruas de Portugal e saborei a liberdade reconquistada. Então agora sem pide, sem Censura, sem prisões, então agora o povo não deve manifestar e cantar?
Amanhã é dia de festa. Viva o 1º de Maio!»

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