sexta-feira, 24 de abril de 2020

ALGUÉM LHES DIRÁ O QUE SOFREMOS...


Estas são as últimas fotografias de murais, pintados, pós 25 de Abril, nas ruas de Lisboa.

Havia mais algumas mas estão em muito pior estado do que aquelas que foram publicadas.

Há 46 anos, sem muitos o saberem, chegávamos à véspera do Dia das Surpresas.

Neste caminhar do 25 de Abril pelo tempo, há quem pergunte se o 25 de Abril cumpriu o que, por aqueles dias, foi prometido ao povo.

Há um poema de José Saramago em que se pode ler:

«O homem diz que sabe o caminho, mas não acrediteis porque o homem não sabe o caminho e há sessenta séculos que o homem diz: Eu sei o caminho mas nós sabemos que o homem não sabe o caminho e outros sessenta séculos ouviremos o homem dizer: Eu sei o caminho mas o pobre do homem não soube, não sabe, nem saberá jamais o caminho.»

Não sei das contabilidades do cumpriu ou não cumpriu.

Pelo menos sei de uma, e considero-a de uma importância tal que me faltam palavras:

O FIM DA GUERRA COLONIAL!

Lembram-se das palavras de morte que o botas-ditador-de-santa-comba
nos lançou?

«A Pátria não se discute, defende-se!»

Mas qual pátria?

Toda uma juventude serviu de carne para canhão para defender o que nem sequer era nosso.

O Jorge de Sena tem um poema, simplesmente arrepiante, que marca o quanto foi possível aqueles ditadores de pacotilha terem resistido tanto tempo:


«Uma vez eu, chegando a Portugal
após muitos anos de ausência minha e alguns
de guerras africanas, encontrei uma vizinha
muito estimável que era casada com
um operário categorizado e antigo republicano.
O filho dela estava nas Africas, arriscando
a vida dele e a dos outros em defesa
do património da pátria de alguns (muito mais
que das gerações brancas que vivem nas Áfricas).
Eu condoí-me, todo embebido de noções políticas.
E ela, com um sorriso resignado, respondeu-me:
- Pois é, mas ele está a ganhar tão bem!»

Os cinco dias a que me propus o colocar fotografias dos murais, juntando uma canção daqueles tempos, levou a que muitas dessas canções tivessem ficado de fora.

Mas o Manuel Freire não poderia faltar.

Foi ele que com a «Pedra Filosofal» divulgou o António Gedeão, o próprio poeta o reconheceu, que não teria a projecção que teve, se não fosse essa canção.

Mas irei escolher «Livre», um poema de Carlos de Oliveira que faz parte de um EP editado em 1968.



Legenda: o título é tirado de um poema de Egito Gonçalves.

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