As horas em que não
sabemos uns dos outros: família, amigos…
O acabar de cada dia
é o testemunho de uma profunda e amarga nostalgia.
Há que pontapear as
quebras de ânimo, a angústia do guarda-redes, também do pontapeador, no momento
do penalty.
Na casa silenciosa
lembrei-me de Karen Blixen, do seu livro que deu origem a um filme de Sydney
Pollack.
As paisagens africanas
do Quénia, as longas panorâmicas, a liberdade livre dos largos espaços.
A última vez que vi o
filme numa sala escura, e Out of Africa
é daqueles filmes que não suporta o formato televisivo, foi na tarde de 22 de
Março de 2006, com a respectiva folha assinada pelo Manuel Cintra Ferreira, que
tinha a quase certeza que Pollack poderia ter feito um grande filme em vez de,
apenas, um filme bonito.
Quando voltarei à
Cinemateca?
«I had a farm in Africa at the foot of the Ngong Mountains.»
Lá pelo meio, Robert
Redford, no safari, a lavar o cabelo a Meryl Street, aquele diálogo quando o criado Ndwetti fala do voo que Karen
Blixen fizera com Denys:
« — Hoje subiram muito alto. Não vos conseguíamos ver, só ouvíamos o aeroplano zumbir como uma abelha.
Concordei que andáramos a voar muito alto.
- Viram Deus? - perguntou ele.
- Não, Ndwetti – respondi eu. Não vimos Deus.
- Ah, então é porque não subiram o suficiente. Mas digam-me lá: acham que conseguem subir o suficiente no seu aeroplano para ver Deus? - perguntou ele dirigindo-se a Denys.
- Na realidade, não sei - foi a resposta.
- Então - disse Ndwetti - não sei porque é que vocês os dois vão voar.»
« — Hoje subiram muito alto. Não vos conseguíamos ver, só ouvíamos o aeroplano zumbir como uma abelha.
Concordei que andáramos a voar muito alto.
- Viram Deus? - perguntou ele.
- Não, Ndwetti – respondi eu. Não vimos Deus.
- Ah, então é porque não subiram o suficiente. Mas digam-me lá: acham que conseguem subir o suficiente no seu aeroplano para ver Deus? - perguntou ele dirigindo-se a Denys.
- Na realidade, não sei - foi a resposta.
- Então - disse Ndwetti - não sei porque é que vocês os dois vão voar.»
Também o Concerto para
Clarinete e Orquestra de Amadeus Wolfang Mozart que fica como a nossa música de
hoje:
1.
Use máscara, não use
máscara, use luvas, não use luvas.
A comunidade científica
não consegue entender que estas contradições são terríveis.
Num tempo trágico como
este, precisamos de confiança.
Sinto que não tenho
confiança.
Isso provoca o
desleixo, o «que se lixe!»
Alivio a figadeira
com «o que se lixe!» … mas: o que me
pode acontecer?
2.
O que este estupor do vírus tem para nos dizer é que é
mito difícil ultrapassar o medo, que, de modo algum, se os povos não estiverem
juntos nesta luta, se pode resolver esta tragédia que se abateu sobre o mundo.
Importantes são os avanços tecnológicos mas de nada servem se falharmos a
solidariedade.
Que ajuda deu a Europa, quando face às primeiras centenas
de infectados e de mortos, a Itália entrou em fúnebre delírio?
Nenhuma!
Somos de uma fragilidade assustadora.
Será bom começarmos a olhar para o que alguns países
europeus, aproveitando-se da pandemia, querem impor aos seus povos.
A Comissão Europeia lembrou o primeiro-ministro da
Hungria, Victor Órban, que os poderes que foram aprovados serão para usar
durante a pandemia de covid-19 e que não haja a suspensão da democracia no
país.
Em causa está a lei que permite a Orbán governar por
decreto, sem necessidade de validação parlamentar e por um período indefinido
do Estado de Emergência. Teme-se que o primeiro-ministro húngaro use os novos
poderes para apertar ainda mais o controlo à sociedade civil.
Mas a gente como Orbán, o que há a fazer é «lembrar»?
3.
Dez milhões de
norte-americanos perderam o seu emprego nas duas últimas semanas.
4.
Durante anos e anos, e anos, ouviram dizer que tinham de
cultivar as terras, criar gado, pescar. De repente, passaram a ouvir que iriam
receber subsídios para deixar as terras ao abandono, abater os barcos.
Vitor Dias, em O Tempodas Cerejas, citava o Expresso-on Line,
e face à constatação do semanário, aproveitava para lembrar um discurso do Miguel
Viegas, deputado do PCP no Parlamento Europeu em 2018:
« Apenas três cereais asseguram quase
metade das calorias que a Humanidade consome: trigo, arroz e milho. Apesar da
sua importância, Portugal é
profundamente deficitário. Em apenas três décadas o país perdeu 71% da
área cultivada com cereais. No final dos anos 80, a superfície cultivada
com cereais ocupava cerca de 900 mil hectares, quase 10% do território nacional.
No ano passado, a área circunscrevia-se a 260 mil hectares, ou seja, menos 71%,
uma perda de 640 mil hectares. De acordo com especialistas, o fim das ajudas
ligadas e a liberalização das Política Agrícola Comum explica uma boa parte
deste quadro.
Hoje Portugal tem um dos
níveis mais baixos do mundo em matéria de autoaprovisionamento de cereais.
Mas se atendermos aos cereais utilizados para a alimentação humana, a situação
é ainda mais alarmante com a produção de trigo a garantir apenas 5% das necessidades
do país.»
5.
Os negros números:
Itália
14.681 mortes
Espanha
10.395 mortes
Estados Unidos
6.586 mortes
França
5.387 mortes
Grã-Bretanha
3.605 mortes
China
3.318 mortes
Irão
3.309 mortes
Holanda
1.487 mortes
Bélgica
1.011 mortes
Alemanha
1.017 mortes
Portugal
246 mortes
No Mundo
58.773 mortes
6.
«Abril é o mês mais
doce, pensou. Tinha a impressão de que escrevera a frase numa das suas novelas,
Abril é um mês azul, os lilases, os jacarandás, os lírios. E o mar, que se
estendia à sua frente, o mar no qual podiam surgir monstros de olhos verdes.
Fechou o livro e pousou-o no muro, estendeu as pernas para o lado das rochas.»
Ana Teresa Pereira, de uma crónica no Público s/d
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