domingo, 5 de abril de 2020

DIÁRIO DOS DIAS DIFÍCEIS


Hoje é domingo.

Merdoso domingo, chove e faz frio.

A cidade envolta numa sinfonia de silêncio.

Leio que Marianne Faithfull foi internada num hospital londrino depois de o seu teste ao Covid-19 ter dado positivo. Acresce que Marianne Faithfull, com 73 anos, sofre de hepatite C e isso não augura nada de bom.

O António Variações dizia que quando a cabeça não tem juízo o corpo é que paga.

Keith Richards, na sua autobiografia Life, lamentava-se que as moças iam todas chorar no seu ombro.

Quando soube que Mick Jagger andava a comer fora, Marianne procurou o ombro de Keith.

Que há-de um homem fazer?

Por uma noite, «quem foi ao mar perdeu o lugar», Keith perdeu-se a contar outras músicas a Marianne.

Eis senão quando os dois ouvem o carro de Mick Jagger chegar.

Relato de Keith:

«Grande alvoroço, pego nos sapatos e salto janela fora para o jardim. Tinha-me esquecido das meias! Mas o Mick também não era gajo para se pôr à procura de meias. E assim ficámos com uma piada para sempre – ainda hoje, a Marianne me diz: «Ainda não consegui encontrar as tuas meias!»

Momento adequado para ir buscar um velho vinil da Marianne, em que a primeira canção do lado 2 é «Ballad of Lucy Jordan, o sol da manhã a tocar, no seu quarto branco, na cidade suburbana branca, levemente os olhos de Lucy Jordan, uma canção que, não por acaso, acompanha as loucuras de Susan Sarandon e Geena Davis em «Thelma & Louise», filme de Ridley Scott.




Finalize-se voltando a Keith Richards, às suas memórias de Marianne Faithfull:

«Só depois disso chegaram os dois a Tânger, acompanhados da Marianne, que ia ter com o Mick a Marraquexe. O Brian estava tão combalido que a Anita e a Marianne, qual competentes enfermeiras, tiveram a brilhante ideia de lhe dar ácido no avião, para ver se ele arrebitava. Elas próprias acabavam de passar uma noite em branco e a ácido. Quando finalmente chegaram a Tânger, um incidente junto à loja do Ahmed instalou o pânico. O sari da Marianne (única peça de roupa que trazia vestida) ficou preso algures e desenrolou-se, deixando-a subitamente nua no casbá.»

Rápidas melhoras, pequena, tu que, um dia, disseste que os vícios tornam as canções mais reais.

1.

A Fnac Portugal, um dos maiores retalhistas na área da cultura, entretenimento e tecnologia, solicitou um processo de lay-off por um mês, renovável por igual período, com efeitos retroactivos a partir do passado dia 1 de Abril, que abrange cerca de 1650 (91%) dos 1800 trabalhadores ao seu serviço.

É um fartar vilanagem.

Só os cegos e os incondicionais daquela trampa de loja se podem espantar.

A Fnac, em algum dia, foi uma livraria, uma loja de venda de discos?

Não terá sido antes um olhar ingénuo e distraído sobre a novidade que nos levou a pensar que…?

Enquanto foi novidade, a Fnac agradou pela diversidade, alguma competência. Depois começou lentamente a derrapar até chegar à javardice que hoje é.

Quando apareceu em Portugal, conseguiu arrasar literalmente com toda a concorrência nacional.

Qual árvore de borracha, secou tudo em volta.


Lembram-se das grandes, médias e pequenas livrarias, das pequenas discotecas de Lisboa, das lojas Valentim de Carvalho, Loja da Música, Discoteca Roma e outras? Até a Virgin!

Deram cabo de tudo e hoje a Fnac mais não é que uma loja de venda de equipamentos informáticos, relógios, outras tretas e onde reina a ignorância, a incompetência, a má educação.

Sindicatos contestam e afirmam que a  Fnac não está em crise.

2.

Em Portugal já recorreram ao lay-off cerca de 32 mil empresas.

«A situação de emergência em que vivemos apela à partilha de sacrifícios e à solidariedade. No entanto, nas últimas semanas, têm-se multiplicado atropelos gritantes à lei laboral. As denúncias feitas incluem o recurso à chantagem sobre os assalariados, levando-os a renunciarem “livremente” ao exercício de direitos fundamentais.»

- de uma carta ao governo assinada por diversas personalidades.

3.

Com quase todo o comércio fechado, a possibilidades da máquina de lavar, a torradeira, a televisão, o micro-ondas   avariarem, uma pequena tremideira instala-se e acabamos por lembrar aquela frase do Woody Allen:

«Não só Deus não existe como é difícil encontrar um canalizador a um domingo.»

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