Os Meus Amores
Trindade Coelho
Portugália Editora,
Lisboa, Junho de 1962
No velho casarão do
convento é que era a aula. Aula de primeiras letras. A porta lá estava,
com fortes pinceladas vermelhas, ao cimo da grande escadaria de pedra, tão
suave que era um regalo subi-la. Obra de frades, os senhores calculam... Já
tinha principiado a aula quando a Helena entrou comigo pela mão. Fez-se um
silêncio nas bancadas, onde os rapazes mastigavam as suas lições e a sua
tabuada, num ritmo cadenciado e monótono, cantarolando. E ouviu-se então a voz
da Helena dizer para o Sr. Professor, um de óculos e cara rapada, falripas
brancas por baixo do lenço vermelho, atado em nó sobre a testa:
– Muito bons dias. Lá de casa mandam dizer que aqui está a encomendinha.
Oh!! Oh! A encomendinha era eu, que ia pela primeira vez à escola. Ali estava a encomendinha! – Está bem, que fica entregue. E lá em casa como vão?
E enquanto o velho professor me tomava sobre os joelhos, a Helena enfiava-me no braço o cordão da saquinha vermelha, com borlas, onde ia metido nem eu sabia o quê. Meu pai é que lá sabia... E ali estava eu entre os joelhos do Sr. Professor, com o boné numa das mãos e a saquinha vermelha na outra, muito comprometido. A Helena, que sorria contrafeita, baixou-se para me dar um beijo, e disse-me adeus.
Choraminguei, quis sair na companhia dela.
– Não, agora o menino fica – disse-me a Helena.
– Isto aqui é uma escola onde se aprende a ler. – E agachando-se, diante de mim: – Olhe tanto menino, vê?
– Mas fica tu também... – disse-lhe eu então.
Nas bancadas houve hilaridade geral. O mestre teve de intervir, iracundo:
– Caluda, sua canalha! Não vêem que está gente de fora? Caluda, que vai tudo raso com bolaria! Foi então que reparei em toda aquela rapaziada. Ah, eles eram todos meus conhecidos! Vivam lá vocês! E estavam todos alegres, pelos modos. Reanimei-me. Então já eu podia ficar, estavam ali os meus amigalhotes; cheguei mesmo a rir das caretas que me faziam alguns, o Estêvão principalmente.
– Isto é preciso muita paciência, Sr.ª Helena, muita soma de paciência. Um mestre precisa de ser um santo –, (Pausa. Olho duro sobre as bancadas.) – Mas está bem, diga lá que a encomendinha cá fica. Em boa hora entrasse...
– Muito bons dias. Lá de casa mandam dizer que aqui está a encomendinha.
Oh!! Oh! A encomendinha era eu, que ia pela primeira vez à escola. Ali estava a encomendinha! – Está bem, que fica entregue. E lá em casa como vão?
E enquanto o velho professor me tomava sobre os joelhos, a Helena enfiava-me no braço o cordão da saquinha vermelha, com borlas, onde ia metido nem eu sabia o quê. Meu pai é que lá sabia... E ali estava eu entre os joelhos do Sr. Professor, com o boné numa das mãos e a saquinha vermelha na outra, muito comprometido. A Helena, que sorria contrafeita, baixou-se para me dar um beijo, e disse-me adeus.
Choraminguei, quis sair na companhia dela.
– Não, agora o menino fica – disse-me a Helena.
– Isto aqui é uma escola onde se aprende a ler. – E agachando-se, diante de mim: – Olhe tanto menino, vê?
– Mas fica tu também... – disse-lhe eu então.
Nas bancadas houve hilaridade geral. O mestre teve de intervir, iracundo:
– Caluda, sua canalha! Não vêem que está gente de fora? Caluda, que vai tudo raso com bolaria! Foi então que reparei em toda aquela rapaziada. Ah, eles eram todos meus conhecidos! Vivam lá vocês! E estavam todos alegres, pelos modos. Reanimei-me. Então já eu podia ficar, estavam ali os meus amigalhotes; cheguei mesmo a rir das caretas que me faziam alguns, o Estêvão principalmente.
– Isto é preciso muita paciência, Sr.ª Helena, muita soma de paciência. Um mestre precisa de ser um santo –, (Pausa. Olho duro sobre as bancadas.) – Mas está bem, diga lá que a encomendinha cá fica. Em boa hora entrasse...
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