Como fantasmas, sem repouso,
no corredor andam os guardas,
de pistola à cinta, dia e noite.
Nuvens vazias lhes pesam.
Um vinho azedo os corrompe.
O corredor é longo e estreito
longo e sujo,longo e escuro.
Do tecto baixo as lâmpadas
exaustas
dir-se-ia que de remorsos lhe
põem mais sombras
na atmosfera sombria de remorso.
Só nas salas, fechados, os
presos falam,
os presos riem,os presos cantam.
Não há remorso na lembrança
deles.
Na desgraça deles não há
remorso.
O remorso ficou lá fora,
no corredor onde andam os
guardas,
de pistola à cinta, dia e noite,
a manchar de vergonha a vida
e a fazer nojo aos escarradores
alinhados contra a parede.
O remorso ficou lá fora,
na felicidade e na cobardia
dos que se alheiam do combate.
Treze são as salas que dão
para o corredor onde andam os
guardas,
de pistola à cinta, dia e noite.
Maldita seja a maldição
com que à honra se responde.
Cada sala tem uma janela
que nem finge de fingimento,
porque além da barreira das
grades
em frente um talude nos cobre
a despreocupação de ave
do horizonte desdobrado,
e lá fora andam outros guardas,
de carabina ao ombro, dia e noite.
Na minha sala há treze presos,
com treze protestos erguidos,
mas erguida uma só bandeira.
São criminosos de querer,
num tempo torpe de prisões,
as torpes prisões arrasadas.
Os outros presos, nas outras
salas,
sangram das mesmas feridas,
ardem de desejo igual.
Estão aqui presos, mas são
livres,
porque neles a justiça
sopra como os vendavais.
A prisão ficou lá fora,
nos felizes e nos cobardes.
Armindo Rodrigues de O Tempo Suspenso em Poemabril
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