sexta-feira, 2 de abril de 2021

OLHAR AS CAPAS


 A Máquina de Joseph Walser

Gonçalo M. Tavares

Editorial Caminho, Lisboa, Abril de 2004

Joseph Walser tinha uma vida disciplinada. Levantava-se às sete horas, barbeava-se, tomava um pequeno-almoço breve. Às oito e rinta entrava na fábrica que pertencia ao império de Leo Vast, o empresário mais importante da cidade que Joseph Walser, em dez anos de trabalho, vira apenas duas vezes e sempre a uma enorme distância.

Das 13 às 14 almoçava. À seis da tarde saía da fábrica e regressava a casa, a pé.

Margha Walser recebia o marido com um beijo rápido. Não tinham filhos, os dias eram calmos, os diálogos entre eles respeitosos.

Margha preocupava-se com a forma de vestir do marido. Não eram apenas os sapatos, todo o vestuário era antigo, fora de moda, descuidado. Não viviam com dificuldades excessivas; Joseph não poderia comprar roupas caras, mas era evidente que o seu desleixo não se devia apenas a limitações financeiras.

Joseph Walser era um homem estranho, falava pouco. O descuido na sua forma de vestir não era mais do que o reflexo de algum descuido em relação ao exterior. Ouvia bastante mais do que falava, mesmo com a mulher, porém a sua forma de ouvir por vezes irritava o interlocutor.

- O caro Joseph Walser estará mesmo a ouvir-me? – era-lhe perguntado vezes sem conta.

2 comentários:

Seve disse...

Bom livro!

Sammy, o paquete disse...

A biblioteca da casa tem dois livros de Gonçalo M. Tavares: este, parado desde 2004, e o «Jerusalém», prenda do meu filho no Natal de 2006. Ambos, foram começados e colocados de lado para um qualquer dia de outras leituras. São grandes as minhas dificuldades com a escrita de Gonçalo Tavares. Certamente culpa minha! Há livros que, aos primeiros tempos de leitura, verifico não terem sido escritos para mim. Repito: culpa minha.
Direi ainda que voltei a pegar nestes livros em tempo de pandemia. Chego à conclusão que se as dificuldades já existiam, o «estado de sítio» que vivemos não ajuda à festa. Não sou de opinião que a clausura a que estamos (momentaneamente?)condenados seja bom tempo para leituras.